top of page



Trólebus & Veículos Elétricos Brasileiros:
Artigos & Entrevistas - Entrevista Jurandir Fernandes 30/08/2021


 

Hoje em nossa entrevista conversamos com Jurandir Fernandes, que presidiu até junho de 2021 a União Internacional de Transportes Públicos (UITP), Divisão América Latina.

 

Jurandir é formado em Engenharia pelo ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica) e mestre e doutor em Engenharia de Sistemas pela UNICAMP, onde foi professor e orientador. Foi também Secretário dos Transportes de Campinas, período em que fundou e presidiu o Fórum Paulista de Secretários de Transportes; Diretor de Planejamento e Desenvolvimento da DERSA; Diretor do DENATRAN (Departamento Nacional de Trânsito); Secretário Estadual de Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo, período em que presidiu os conselhos administrativos do METRÔ-SP, CPTM e EMTU; foi também presidente da EMPLASA (Empresa Metropolitana de Planejamento) e ANTP (Associação Nacional de Transportes Públicos).

Atualmente é Membro do Conselho Gestor da Secretaria dos Transportes Metropolitanos do Estado de São Paulo (STM); Membro do Conselho de Administração da EMDEC-Campinas; Coordenador do Comitê de Transportes e Logística do Conselho de Tecnologia do Sindicato dos Engenheiros de São Paulo (SEESP). 

Confira mais detalhes da entrevista abaixo:

entrevista-jurandir-fernandes.jpg

Jurandir Fernandes

(Acervo Pessoal)

TB: Jurandir primeiramente como surgiu a oportunidade de você trabalhar com transporte público?

JF: No início dos anos 1970 a UNICAMP e o METRÔ SP assinaram um convênio para o desenvolvimento de softwares para simular o impacto das obras do metrô sobre o trânsito da cidade de São Paulo. Como mestrando da área de Sistemas de Simulação e Otimização da Faculdade de Engenharia da UNICAMP fiz parte destes estudos. Desenvolvemos simuladores de tráfego urbano para o Grupo de Planejamento do Metrô. Foi inclusive deste grupo que saiu o embrião de criação da CET-SP.

Assim foi iniciada minha carreira na área de trânsito-transporte, ampliada para o conceito de mobilidade de pessoas e mercadorias.

TB: O que é a UITP. Poderia fazer um breve relato de sua experiência com a instituição?

JF: A UITP foi fundada em 1885 pelos operadores de bondes de Bruxelas, ainda nos tempos da tração animal. Hoje abrange todos os modais de transportes públicos urbanos, das bicicletas aos grandes sistemas sobre trilhos. Possui mais de 1800 empresas associadas e espalhadas por mais de 100 países. Desde 1983 acompanho de perto a UITP quando tivemos no Rio de Janeiro o seu grande evento bi-anual. Tive a honra de presidir sua Divisão Regional América Latina durante quatro mandatos e hoje sou Vice-Presidente Honorário da UITP e Presidente Honorário da Divisão América Latina. Visitem o site e conheçam um pouco do que fazemos: www.uitp.org.

TB: Em sua opinião, aliado à sua experiência, esta expansão da tração elétrica na mobilidade urbana é um caminho sem volta ou apenas um boom momentâneo?

JF: A eletro-mobilidade veio para ficar e continuará crescendo a taxas de dois dígitos. Na verdade, não é uma novidade se lembrarmos que os bondes elétricos eram comuns na Europa do século XIX. Diversos fatores levaram à quase extinção deles em diversas partes do mundo. No Brasil, a chegada da indústria automobilística e a maior praticidade de implantação de linhas de ônibus na explosiva urbanização pós anos 1950 resultaram no abandono desastroso e irresponsável dos transportes sobre trilhos. A visão imediatista de nossos governantes e de boa parte da iniciativa privada predatória, sempre buscou soluções de curto prazo.

A eletrificação em geral e a eletro-mobilidade em particular, vêm ao encontro da extrema necessidade de buscarmos a emissão zero de gases de efeito estufa.

Por outro lado, há um grande avanço tecnológico em toda a cadeia da eletrificação, da geração à armazenagem de energia elétrica. Há avanços em fontes renováveis de origem eólica e foto-voltaica. Na armazenagem, há aumento da capacidade das baterias junto com a queda de preço. A geração descentralizada de eletricidade eliminando redes de transmissão e de distribuição é algo cada dia mais barato para as famílias e para o país. A energia elétrica que hoje percorre centenas de quilômetros até chegar em sua casa pode ser gerada no seu telhado! Menores são os custos de implantação e de manutenção.

Na Europa, a Alemanha se destaca como o país de maior avanço na eletrificação utilizando fontes renováveis de energia. Não custa lembrar que o pior local para captação de energia solar no Brasil é superior ao melhor local na Alemanha. O que pode nos atrasar é a classe política em sua maior parte medíocre e ignorante, voltada apenas para suas metas eleitoreiras. As urgentes reformas: administrativa, tributária, política (para lembrarmos de algumas) são substituídas por discussões infindáveis sobre o voto impresso ou não.

TB: O trólebus tem futuro nesta nova fase da eletromobilidade? É possível integra-lo aos outros modais em uma metrópole?

JF: O maior crescimento dentre os ônibus elétricos tem ocorrido nas versões a bateria que tem a vantagem de maior flexibilidade operacional e de implantação, uma vez que não depende de uma rede aérea. No entanto cada local saberá analisar o que mais lhe convém ao escolher a eletrificação.

TB: Falando um pouco sobre o futuro da mobilidade: quais as perspectivas frente às mudanças mundiais devido à pandemia de covid 19?

JF: A humanidade terá pela frente ao menos três temores: as pandemias, as mudanças tecnológicas (desemprego) e as mudanças climáticas (catástrofes). Não estou aqui menosprezando a estupidez humana de provocar guerras mas os três temores acima já estão no horizonte e provocam sequelas econômicas e sociais por todo o planeta.

Voltando aos três temores, podemos assegurar que já estamos vivendo mudanças causadas por eles. As reuniões on-line, o comércio eletrônico, o ensino à distância, o delivering, os seminários e congressos, as audiências públicas são processos que não retrocederão no pós pandemia. Muitos outros eventos serão modificados seja para o formato totalmente on-line ou para o híbrido.

As pessoas procurarão perder menos tempo nos seus deslocamentos. Os subcentros urbanos e o comércio de vizinhança ganharão espaço. Para os que podem trabalhar de forma remota, serão valorizadas as residências fora dos grandes centros. Aos que precisam trabalhar presencialmente, a menor distância ao local de trabalho será mais e mais valorizada.

A eletrificação será acelerada em todas as áreas, na indústria, na agricultura, no comércio e nos serviços. Tudo isso afetará fortemente a mobilidade urbana e a vida urbana de forma geral. Estão iludidos os que pensam que tudo voltará ao que era antes.

TB: Mobility as a Service (MaaS): essa revolução já está atingindo o Brasil? Poderia abordar a relação dessa disrupção com os novos conceitos em MaaS e com os novos desafios para os gestores públicos mundiais?

JF: Podemos dizer que a Mobilidade vista como um serviço é uma tendência que se espraia por diversos países. A pandemia trouxe interrupções e atrasos ao seu desenvolvimento que não depende apenas de tecnologias. Podemos até mesmo dizer que os aspectos institucionais e os interesses conflitantes entre os envolvidos poderão causar atrasos maiores em sua implantação.

TB: A UITP e a ANTP são as grandes pensadoras mundiais de um transporte público eficaz, eficiente, efetivo e sustentável. Embora não subordinadas, as duas se complementam. Poderia abordar como esse complemento se dá? E há outras instituições mundiais com o mesmo objetivo da ANTP e UITP? Poderia citar algumas delas?

JF: Sim, as duas entidades tratam do mesmo tema em seus respectivos espaços de atuação. Há inúmeras outras entidades de caráter tanto nacional quanto internacional tratando dos transportes em suas variadas formas, porém a UITP é a que possui maior abrangência planetária.

bottom of page